Charles Darwin incluiu em seu Origem das espécies, de 1859, uma página sobre o extenso material zoobotânico coletado na região de Lagoa Santa a Curvelo por Peter Willelm Lund.
Por: Mauro Werkema - Jornalista

Mauro Werkema - Jornalista
Charles Darwin incluiu em seu Origem das espécies, de 1859, uma página sobre o extenso material zoobotânico coletado na região de Lagoa Santa a Curvelo por Peter Willelm Lund, médico e naturalista dinamarquês, que viveu em Minas de 1832 até sua morte, em 1880. Em 1842, Lund relata ter visitado cerca de 200 cavernas e identificado 115 espécies animais desta região, inclusive o famoso tigre-dente-de-sabre. Em 1843, descreveu “vestígios” de homem pré-histórico, que ficaria conhecido como o homem de Lagoa Santa, de que o Museu do Homem de Paris tem um crânio. Em 1845, enviou sua coleção, integrada por 20 mil itens, para o rei Cristiano VIII, da Dinamarca, que se encontram hoje no Museu de Copenhague. O zoólogo Johannes Reinhart (1816-1882) e o botânico Eugenius Warming (1841-1924) trabalharam e foram orientados por Lund, ambos com contribuições pioneiras, a partir de pesquisas na região, destacamente na Serra do Cipó.

Os achados por Lund, citados por Darwin, contribuíram como elementos de convicção e de demonstração para a teoria da seleção natural, extraordinário marco de evolução do conhecimento da evolução das espécies animais e vegetais. Desde Lund, muitos foram os exploradores da região, ampliando-se os achados arqueológicos e palenontológicos, por pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), da PUC Minas, Universidade de São Paulo (USP) e franceses, com melhor formação científica. Recentemente, arqueólogos da UFMG e USP descobriram o crânio da Luzia, com datação próxima de 30 mil anos. Fácil é, portanto, inferir a importância da região de Lagoa Santa para nosso patrimônio cultural científico e para o turismo. Potencialidade que se eleva pela ativação do aeroporto de Confins, pela Linha Verde, pela valorização turística da Serra do Cipó, pela proximidade de BH e outras grandes cidades.

Em 1978, a professora Gilca Wainstein, diretora da Fundação de Desenvolvimento de Pesquisas (Fundep), da UFMG, com apoio do então governador Aureliano Chaves e do então reitor Celso Pinheiro, elaborou um projeto de implantação, em Lagoa Santa, de um Museu do Homem. Obteve a colaboração do antropólogo Darcy Ribeiro, que elaborou completa proposta sobre a evolução do homem, texto em que se baseou o arquiteto Oscar Niemeyer para a elaboração de anteprojeto arquitetônico. Ambos estudos constam de publicação editada pela UFMG, inclusive os desenhos de Niemeyer e os detalhamentos de natureza científica e museológica. Em 1983, ao assumir a Secretaria de Estado da Cultura, a convite de Tancredo Neves, o secretário José Aparecido de Oliveira tentou implantar o Museu do Homem, infelizmente não o conseguindo em razão das dificuldades do período.

Por ocasião da elaboração do projeto, o secretário de Ciência e Tecnologia de Minas, professor José Israel Vargas, designou seu adjunto, Otávio Elísio Alves de Brito, para conversações com o governo dinamarquês tendo em vista o retorno da Coleção Lund. Foi dito ao enviado mineiro que parte da coleção poderia ser devolvida se Minas comprovasse condições reais de proteção e conservação do material. Os projetos Linha Lund e Parque do Sumidouro, em desenvolvimento pela vice-governadoria do estado, abrem agora essa possibilidade. Seria adequada, senão imprescindível, a releitura do projeto do Museu do Homem, que naturalmente teria o apoio decisivo da UFMG e da PUC Minas, ambas com coleções suficientes para a organização museológica. O ouro, também levado para o exterior, nos legou as cidades históricas e valioso acervo artístico. A Coleção Lund é raro e valioso patrimônio de Minas, que, se recuperado, será riqueza cultural e turística.


Jornal Estado de Minas - 20/05/2009